Orçamento público em colapso

Não há espaço e tempo para demagogia e aventuras fiscais

Nos últimos anos, o orçamento público tem se encaminhado a assunto central na pauta política brasileira. Isso se deve, em parte, ao tema da responsabilidade fiscal levantado durante o processo de impeachment da Presidenta Dilma Rousseff, que jogou luz no manejo das contas públicas pelo governo federal.

O orçamento público é instrumento utilizado pelo governo para planejar a utilização do dinheiro arrecadado com os tributos (impostos, taxas, contribuições de melhoria etc.). Na atualidade, a problemática envolvendo o tema reside no fato de que crescem as demandas a serem atendidas via orçamento, ao passo que os recursos públicos para esse fim tendem a diminuir. Além disso, o Brasil tem um dos orçamentos mais rígidos do mundo, resultado de vinculações legais de receitas e do percentual mínimo de despesas obrigatórias, restando apenas um estreito residual de recursos para a execução das despesas discricionárias, como investimentos em infraestrutura de transporte e saneamento básico, por exemplo.

O perfil do gasto público brasileiro aponta que mais da metade de toda a despesa pública é alocada para a previdência social (53.67%), seguida das despesas da saúde (11.71%), assistência social (11.50%) e educação (6.96%). Os gastos com saúde e educação possuem percentual mínimo obrigatório (art. 198 e 212 da CF/88), razão pela qual não podem ser sucumbidos ou remanejados dentro do orçamento. Por outro lado, gastos com saúde e previdência social devem ser ampliados à medida que a população envelhece.

No que se refere às despesas da saúde e educação, o histórico da última década aponta que, em percentual do PIB, o Brasil despende montante próximo ou abaixo da média dos países da OCDE. Em um país com demografia jovem como o Brasil, esse fato aponta que a diminuição de gastos nessas áreas não é recomendada. 

Com relação à previdência social, principal componente do gasto público brasileiro, o histórico aponta que as despesas nessa área estão muito acima da média dos países-membros da OCDE, cujas demografias são significativamente mais velhas. Ao refletir um gasto desproporcional que tende a se agravar à medida que a população envelhece e o grupo de contribuintes do sistema diminui, resta clara a necessidade de (i.) aumentar os recursos públicos para fazer frente a realidade da previdência social, o que significa elevar a arrecadação tributária, ou (ii.) reformar o sistema previdenciário e/ou o funcionamento da administração visando poupar recursos, visto que estes tendem a diminuir. A primeira alternativa mostra-se remota à vista da crise econômica que desampara os contribuintes, especialmente os de baixa renda, e a segunda, também pouco factível por cobrar um alto custo político.

O tema do orçamento público e os dados acima ganham relevo com a Nota Técnica Conjunta emitida pelas Consultorias de Orçamento da Câmara dos Deputados e do Senado Federal sobre o Projeto de LDO para 2023. A nota avalia que o progressivo aumento das despesas obrigatórias, associado às restrições impostas pela regra do teto de gastos, conduz a uma inviabilidade administrativa e política nos próximos anos que afetará o mandato do futuro presidente. Como os gastos obrigatórios continuarão a crescer, segundo estimativas oficiais, o novo governo terá de comprimir ainda mais as despesas discricionárias para conseguir cumprir o teto de gastos – o que inclui diminuir gastos com infraestrutura social e econômica, inexoravelmente necessárias para o desenvolvimento socioeconômico do país -, gerando um cenário de futura paralisia.

Apesar disso, há pouquíssimos dias o Congresso Nacional – cujas consultorias de orçamento emitiram a nota técnica acima mencionada – aprovou a “PEC Kamikaze”, que cria um estado de emergência às vésperas da eleição e permite ao governo federal driblar leis fiscais e eleitorais para criar benefícios sociais em ano de eleição, o que é proibido. O custo dessa jogada eleitoreira é calculado em R$ 41 bilhões, sem qualquer estudo social e fiscal que respalde a manobra engendrada pelo Executivo e surpreendentemente ratificada pelo Congresso Nacional, inclusive pelos partidos de oposição. 

É provável que o próximo presidente da República não tenha a popularidade e o apoio político necessários para avançar com reformas estruturais (administrativa e tributária) que poderiam liberar algum espaço fiscal e/ou auferir mais recursos via tributação, o que, somado à remota possibilidade de um simples aumento da carga tributária para obtenção de mais recursos, evidencia um cenário de difícil solução para as finanças públicas.

É preciso que o orçamento público, uma vez trazido ao papel central das estratégias e decisões políticas, seja tratado com maior transparência e responsabilidade no iminente pleito eleitoral – e muito provavelmente nos próximos. A sociedade precisa se apossar de um dos assuntos mais importantes na atualidade para o futuro do país. Mais do que nunca, não há espaço e tempo para demagogia, malversação do dinheiro público e aventuras fiscais. 

 

Bruna Souza da Rocha

Advogada. Mestranda em Direito do Estado pela Universidade Federal do Paraná. Especialista em Direito Econômico pela GVLaw Direito SP.

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